28 de agosto de 2009

Momento

Estou atrás de alguém que dê aulas da preparação vocal.
Em busca de movimento, que o momento é de preparação.

Quero melodia para encaixar nos versos soltos e sem alma espalhados pelo caderno verde.

17 de agosto de 2009

Surdo eu sei ou Surdo que eu sei

Sem coragem não ouve
Nem fala; por quê
Se sem som é bem melhor
vou ritmado pelo viver
novo amor ele me trouxe
esquecer vai ser só.

Fico surdo
Toco surdo
Ela eu mudo
mudo eu fico.
que é como surdo
que falo tudo

Bato de perto
perco o instrumento no meio do show
que ela é bruxa
minho dor só piorou
Pego logo
domino e pou!
Coração ainda bate incerto
nota de lambuja
toque que sobrou
amante da rima de quem amou.


...


Qual o melhor título para o meu descompromissado versinho?

16 de agosto de 2009

Between me and my jeans

Inspirada pela co-autoria de objetos simbólicos e suas grandes estórias, resolvi deixar o cartão com seu semi-herói de lado e embarcar nos causos de duas calças jeans.

Foram adquiridas numa quinta-feira de agosto. Uma por uma menina de cabelos morenos soltos e palavras largas, que entrou no provador e ficou aos berros com uma outra altona lá fora. Experimentou seis, todas na promoção, depois de pulinhos sacrificantes para caber dentro de uma 38 levou uma das menos justas.

Outra por uma loirinha de curtas mechas e riso avoado, que entrou na loja com quatro guarda-costas. Não me lembro bem quantas experimentou, mas me adquiriu depois de uma troca de olhares com um dos rapazes, que me elogiou muito em seu corpo.

Acabamos juntas na noite carioca. Na sexta em um show, aonde as duas chegaram cedo e ficaram cheias de opinião contando da vida e de rapazes. Apoiadas sobre o cerco da varanda de um sobrado velho, que era imenso de lembranças, como disse a morena; elas ficaram a procura de príncipes encantados.

Como os que estavam no palco. Ao lado de donzela invejável que formava o trio de rock fazendo o barulho bom de baladas descompromissadas e bem feitas. Certamente as baladas emitiam o som perfeito dos corações pulsantes das menininhas. Duas atrapalhadinhas...

Elas nos levaram pra uma festa privet dos astros da banda e tremiam as pernas ao lado deles. Tiraram foto, fizeram piada, ouviram uma sessão de besteiras boas no banheiro e voltaram pra casa.

Pra no sábado nos encontrarmos de novo. Bater muito. Bater, bater, bater... Somos lindas, não podemos ser modestas. Transformamos os corpinhos das duas e só se fizeram garotos para acompanhá-las nessa noite. Todos ótimos meninos. Comeram salgados numa lanchonete, ficaram parados na porta de uma danceteria, comeram cachorros-quentes na Voluntários e jogaram sinuca o resto da noite.

Sobraram segredos entre nós quatro. Barbas, fuscas, foto, flertes, Top Five. Calças e suas donas.

O "Oi Anna" vai ficar na saudade...

4 de agosto de 2009

Pedindo perdão pela ausência

Palavras velhas de um amor puído

O cartão melancolicamente empoeirado, sobrando no fundo da prateleira. Sou eu e uma história de amor. Relatos da vida pessoal de um objeto confeccionado para nutrir os mais belos sentimentos e perceber o mais destemido e deslavado destino dos tolos amantes.

Compraram-me no inverno; no fim de Junho quando todos os cartões mais sofisticados já tinham sido vendidos no dia dos namorados. Época do ano em que os atacadistas estão mais preocupados com o dia do amigo e se esquecem do amor. Eu compreendia a minha ineficiência.

Um rasgo na lateral e o Garfield. O gato laranja sem alma e que não emana nenhum romantismo; estava eu fadado ao fundo do almoxarifado durante o próximo verão. Pois estão, a mocinha chegou.

Olhando a seção de Amizade primeiro, abrindo vários, parecia-me fazer daquela breve leitura uma diversão. Continuava a folhear os múltiplos coloridos já com desinteresse quando avistou a minha estante. O mostruário imenso de ilusões.

Catou os primeiros, mas ela era refinada. Buscou os menos comerciais, os mais autênticos. Descreveu assim o seu amor por ele “Menos comercial e mais autêntico”.
Fui adquirido por seis reais e vinte centavos. O troco ela entregou na mão de um menino de rua. Soube então que tinha a sorte de ter uma dama exemplar.

Quando chegou a casa me pusera na última gaveta, debaixo dos antigos álbuns de figurinhas, com o provável medo de que a mãe descobrisse suas esperanças românticas. A mãe procurando um extrato achou-me depois de duas semanas, mas não comentou nada. Não que eu tenha ouvido. Eu começava a ficar empoeirado novamente quando a moça puxou a gaveta de uma vez, esbaforida; cheguei a pensar que eram novas figurinhas. Mas era a minha hora.

Os materiais infantis forjavam bem a madura donzela que escondia com fitas no cabelo as palavras de um amor destemido, ousado. Seu amado não era ficção, nem ilusão. Descreveu-me suas carícias, seus apelos, seus “maravilhosos lábios inferiores”. Me contou teu amor, me pediu pra não esquecer e disse que éramos muito jovens, muito amigos, e somente.

Que tinha visto um filme que lhe recomendara e estava inspirada. Disse que me amava e que não deveríamos ficar juntos. E que eu nunca a esquecesse. E que seríamos certamente eternos.

Confundiu o embriagante rapaz a quem fui entregue alguns sete meses depois. Durante o outono, no centro da cidade, eles conversavam, riam, gemiam, suspiravam baixinho esses suspiros que só eu compreendo. Ela me arrancou do fundo da mochila junto com um pingente dourado e eu só pude ver as pistas congestionadas de cada um dos lados, em diferentes direções.

Entrei noutra mochila. A dele; o pobre acusado de ter outra. Sem tom de acusação ela só me declarou da nova desventura dele e ele chorou demais quando ela disse que era melhor que não se vissem nunca mais. Ela tomou um ônibus no ponto da direita. Ele tomou um no da esquerda e soluçava amedrontado.

Caiu na cama naquela tarde, enroscou os braços atrás da cabeça e ali permaneceu durante umas duas horas com o cartão no peito, olhando pro teto. As lágrimas rolavam pelo cantinho de seus olhos e o coração, deu pra sentir muito bem, tinha repousado como ele e parecia gemer de dor, não sei bem como, nem por quê.

Gostei dele também. Mais simples, mas nunca comum. Deixou-me na gaveta de cuecas, junto com um bonequinho samurai e o pingente. Quando estava sozinho em casa punha o som alto e eu via seus lábios percorrendo as palavras bonitas que faziam a minha transformação de um cartão qualquer para a história de amor daquele casal.

Chegava a me apoiar na varanda, erguer a mão, ameaçar picotar-me em mil e fazer chuva colorida da avenida lá embaixo. No entanto desistia. Parecia encarar com valentia aquele infinito amor.

Cá estou. Na mala do viajante. Percorri o mundo com o homem apaixonado sem paixão. Ele namorou três anos quase quatro. Abandonou a faculdade. Abandonou a família, mas volta de vez em quando comigo. Virou professor de amor, ensina literatura transformando todas as histórias na sua e de sua amada. Péssima compreensão textual. Mas os alunos gostam, são todos jovens estúpidos que amam em todas as partes do mundo. Como ele foi. E é.

No pé de um pôster de filme americano ele rasurou, quando passava por um cinema abandonado na décima sexta avenida: Mais comercial e menos autêntica.

Recebeu seu último livro pelo correio em alguns meses enrolado no pôster. Com o dito ainda gravado abaixo dos pés dela. Dez anos mais mulher e quase nua, uma estrela. Ele leu o livro inteiro, a procura de qualquer resposta e encontrou no capítulo cinco, página oitenta e cinco.

“Não abuse das palavras velhas de um amor puído. Sua literatura sou eu se meu cartão ainda existe.”