26 de novembro de 2013

Enquanto eu faço um remédio da minha cabeça

Um banheiro de pastilhas cinco por cinco nas cores amarelo, azul, verde, vermelho e branco. Sem qualquer formalismo. Podendo fazer o desenho que for.

Um belo dia acordam no teto dois pelados. De cabeça pra baixo ficam supondo as inúmeras possibilidades de figura e fundo que o colorido promove. De tanto ele olhar praquela florzinha igual a do anel dela que ela aposta que está bem na direção da ponta do pé esquerdo. Ele diz que está com quadradinhos coloridos nos olhos. Ela ri e fala que é a quantidade de anfetamina na cabeça dele.

Ela ganha um beijo atrás da orelha. Cai uma lágrima.

O chão do banheiro tá ensopado. Cozinhando uma infelicidade.

Ela quer alcançar o telefone da emergência boiando lá embaixo, mas a gravidade não existe mais. O frio na barriga não tem mais o gosto daquela pele cheia de sal. A água toda é menos úmida, mais insossa.

Ela fica p(a)irando no teto. Tenta encontrar ele lá embaixo.

Espera o momento que um braço vá emergir e puxar uma cordinha que a despenque. E que ela caia na água. Sinta o corpo dele. Que eles façam na piscina. Que toque o que há de mais cafona dos anos 70. E nunca mais a ressaca vai ser tão ruim quanto tem sido.

Um banheiro de pastilhas cinco por cinco nas cores amarelo, azul, verde, vermelho e branco. 
Nele toda a loucura faz sentido.                                                                                                 
Fora dele eu to perdida querendo encontrar a chave dele de mim.

11 de novembro de 2013

Mondongo

Estive com você treze vezes antes de conhecer. Em alguma delas você hesitou em perguntar a direção do portão de embarque porque eu tinha cara de cigana. Na décima esbarrei na corrida pra pegar o ônibus e tive vergonha de pedir desculpas. A primeira dessas vezes fomos as duas crianças tímidas convidadas a subir no palco de um teatro de domingo. Você ensaiou um passinho da quadrilha e eu acompanhei. Me deu um beijinho na bochecha e me esqueceu.

Eu esqueci de você algumas vezes antes de te ver. Te olhei várias antes de reconhecer. Já estivemos a menos de cinco metros em alguns festivais; na mesma fila daquela mesma casa noturna; atrás um do outro na disputa pelo primeiro drinque grátis. Fui apresentada a você uma vez enquanto ensaiava uma abordagem ao seu melhor amigo. Você veio me dizer há muito tempo que eu era parecida com uma amiga sua e eu certamente fui antipática. Eu sou de fato parecida com uma amiga sua. E nem foi ela que nos aproximou.

Te vi numa noite. Te olhei numa foto. Te reconheci num show. Mas acho que nunca soube bem quem você é. Coleciono uma série de possibilidades de te encontrar por aí que sempre foram tão fartas quanto parecem agora que eu vivo a colecionar. É como se eu tivesse entrado na fase em que você existe. O fundo e os movimentos são os mesmos, mas existe uma nova dimensão. Ou existe a vontade de ter te encontrado antes, ter aproveitado mais, ter usado óculos.

Quando eu já sei onde te achar e fica cansativo encontrar, a experiência vira uma história. Eu adoro histórias, mas elas serão eternamente melhores como experiências. Nesse momento eu choro, pra vista ficar turva de você. E tentando não te ver eu vou reconhecer que existem muitas dimensões, a gente enxerga muito pouco e nunca cansa de encontrar. E quem sabe da próxima vez que você passar eu vejo alguém que eu nunca soube enxergar.