Para quem procura um momento pra Hey Jude e não foi no show do Paul vou lhes dizer com exatidão.
Eu era uma garota saindo de casa sem muito saco de ir até o Centro. Fui dar uma volta pela redondeza. Cuidado redobrado sem a mãe por perto. Dobra duas ruas à direita, encontra duas senhoras e três crianças, uma num carrinho de bebê. Tem algum parque por aqui? Segue em frente que você verá um portão. Em frente e um portão. Tira uma foto e a bateria acaba.
Começa um outro lado. Segue a trilha de neve pisoteada. Olha um homem fotografando com tripé e equipamento. Olha pra onde ele olha. É um novo mundo. Um marco zero. Abaixo de zero está tudo o que é novo, que faz tremer o corpo inteiro. Acima, tudo o que é essencial: família, amigos, a segurança da cidade insegura. Mentira quando falam que é sem graça enxergar tudo branco. Isso aqui é como uma livro pra colorir e eu posso te mostrar as cores que eu enxergo.
Devia ser um campo lindo, com um banquinho pra sentar no meio e uma placa indicando um parquinho e algum monumento histórico. Tem um casal caminhando com dois cães que parecem lobos. Um deles me encara desvendando meus sentimentos, farejando meus estrangeirismos. As senhoras vêm com as crianças e o carrinho atrás de mim. O farejar delas é tão humando quanto as minhas lágrimas. Essa água morre nas marcas da minha luva, enxugando meu rosto. Eu sei qual o significado de achar que entende tudo sem precisar de fato entender.
Aqui é só eu. E o meu Salgueiro Lutador alí na frente. Apresso o passo até ele. Sento no banquinho e da uma vontade de olhar a entrada secreta pra Casa dos Gritos. Lá estou eu desvendando as raízes das árvores. Deixando minha bota afundar na neve até eu poder gravar imagens o suficiente na minha memória. Aí toca Beatles, a música sem momento, que eu escolhi esse pra presentear.
Não tem horizonte, tudo é foggy, nada é claro. Nada nunca foi tão esclarecedor quanto o céu se misturando com uma superfície sem fim. Meu corpo sem temperatura definida. Minha mente é um suspiro de surpresa seguido por alívio recompensador. Não vale a pena pensar em ninguém. Isso que aconteceu nasce segredo entre você e você mesmo. Gostar de alguém já torna tudo colorido. Aqui quem não vê em cor, não deve ter muitos amigos.
Entrou pro ranking de uns acontecimentos inesquecíveis da minha vida.
Você tá certa. Se eu pudesse encarar de frente o Salgueiro Lutador e de quebra dar um passeio na Casa dos Gritos, isso também seria um dos acontecimentos inesquecíveis da minha vida ;)
ResponderExcluirQue momento único!
ResponderExcluirFico feliz que tenha acontecido. E tenho certeza que muitos virão ainda!
Beijos